sexta-feira, 25 de novembro de 2011

UMA CARTA DE AMOR


As cartas de amor entraram em desuso. Mas quem não gostaria de receber uma? E poucos são os que admitem e menos ainda os que têm coragem de falar pois poderia parecer piegas, retrô.
Pensando em escrever sobre este tema, fiz uma primeira pesquisa no google, achei um programa no site baixaki.com.br, que se chama “Gerador de Cartas de Amor – 1.0” com a promessa de criar uma carta personalizada, que tivesse mais a ver com seu amor. O programa estava temporariamente suspenso. Caí na risada! Provavelmente não teve ibope. Porém existem muitos sites que oferecem cartas prontas.
Agora imaginem por que uma pessoa precisaria de um programa que lhe “ajudasse” a construir uma carta, ou de cartas prontas. As pessoas perderam a criatividade? Ou com a velocidade das informações elas preferem “o bolo pronto” pois assim economizam tempo?
Acredito, primeiramente, que não somos educados em nossas famílias para compreender e expressar qualquer sentimento. Especialmente os que são considerados negativos costumam ser totalmente reprimidos. Dessa forma não construímos a devida conexão com nosso lado afetivo-emocional e conseqüentemente não aprendemos a nos comunicar claramente sobre o mesmo com as pessoas as quais nos relacionamos. E para escrever uma carta de amor é necessário estar em profunda conexão com nossos sentimentos amorosos.
Em segundo lugar, na modernidade, após os movimentos de liberação sexual, muitas sociedades passaram a vivenciar a sexualidade de forma mais livre, apesar de o pensamento cultural sobre as relações de gênero não ter mudado no mesmo ritmo. Assim, os indivíduos não têm mais a necessidade de estar num relacionamento para experimentarem as diversas formas de contato com o outro. Isto por um lado, favoreceu uma permissão maior para a escolha das parcerias, mas por outro, trouxe o medo e a desconfiança com a vinculação, uma vez que culturalmente não houve uma mudança significativa nos papéis do homem e da mulher. Ainda existem expectativas retrógradas sobre os mesmos, do tipo o homem ter que provar sua masculinidade através da virilidade e a mulher ter que se comportar de forma recatada para ser considerada confiável. Nesse contexto, podemos reconhecer o aparecimento de um padrão de relações descartáveis onde vemos muitos casais que se dizem numa relação, mas com uma vinculação frágil devido ao medo da entrega, do abandono ou do sofrimento, e então, é melhor não declarar nem registrar o amor para não correr riscos. É uma forma de defesa.
Por trás dessa perspectiva de defesa, identificamos - o quarto ponto - também um sentimento de insegurança. Receber uma carta significa que alguém escreveu primeiro, e se declarou primeiro do que o outro. E neste contexto de relações fragilizadas, buscamos muitas vezes a segurança no outro, ou seja, eu tenho que ter certeza de que o parceiro está se entregando para só posteriormente eu me entregar. Assim, nos focamos no outro esperando sua reação, para que ele nos dê a segurança de que podemos “entrar nesse barco”, e nos esquecemos de olhar pra dentro de nós mesmos e entrar em contato com nossos sentimentos mais profundos a respeito do relacionamento. Realmente, não ser correspondido é uma ferida ao ego e ao coração, mas acredito que é melhor ser ferido por um dia ter amado do que manter o próprio coração intacto de cicatrizes pelo medo de amar. A segurança precisa vir de dentro, quando aprendemos que merecemos ser amados, mas não temos nunca o controle sobre os sentimentos do outro e que não precisamos mendigar amor, pois a vida oferecerá novas oportunidades para a troca amorosa realmente acontecer.
Por último, não podemos esquecer também da função do avanço tecnológico que nos trouxe a velocidade da comunicação da Internet, que têm deixado a escrita manual em segundo plano. Mas e-mail de amor não é válido para os corações dos amantes!! A escrita impressa é fria, a escrita a mão é quente, podendo muitas vezes ter até cheiro e lágrimas...
Dois filmes que assisti há algum tempo, fazem referência a carta de amor. No filme “Noivas”, com direção de Pantelis Voulgaris, quando Niki descobre a carta de amor que Norman havia deixado pra ela - na ocasião do encontro deles no navio que migrava as noivas que iriam se casar na América - numa caixa com as fotografias das noivas, ele declara seu amor no início da carta dizendo “só pra você não dizer que nunca recebeu uma carta de amor”. O amor que não pôde ser vivido ficou guardado no coração de ambos e eternizado pela carta.
No filme “O Clube de Leitura de Jane Austen”, dirigido por Robin Swicord, um dos casais passa por uma crise conjugal e separação (Daniel e Sylvia). Daniel foi o traidor e depois de arrependido, ao tentar recuperar seu casamento com Sylvia, entra para o Clube e numa das conversas com Bernadette, comentando sobre os homens vistos pelo olhar de Jane Austen, afirma que nunca devemos subestimar o poder de uma carta bem escrita. Então ele tem um insight e escreve uma carta de amor – entre outras coisas – para a ex-esposa de forma que consegue resgatar o casamento.
Qual é então o poder de uma carta de amor?
Abrir o coração para explicitar os nossos mais profundos sentimentos, é nos deixar nu diante do amado, mostrando toda nossa fragilidade para ele. Esta é uma das maiores demonstrações de confiança e entrega.
A carta nos ajuda a falar do que nem sempre conseguimos falar na frente do amado, pois diante dele, nossas emoções nos perturbam o coração, os pensamentos e a linguagem, e assim nos faltam palavras. Ao escrever a carta, estamos distantes, o que nos dá o distanciamento necessário para conseguirmos colocar as idéias em ordem e poder passá-las para o papel e em seguida para o amado.
Uma carta de amor concretiza aquele sentimento que o outro tem por você. É uma prova de que um dia alguém te amou. E se você quiser, pode guardá-la “eternamente”, enquanto tiver vida. Eternizá-la.
Eu confesso o meu desejo de um dia receber uma carta de amor... Talvez no fundo eu ainda sofra daquele romantismo antigo... Tenho que admitir, esta é a verdade!
Eu sempre pensei o quanto seria emocionante receber uma carta de amor, mas depois de escrever este texto, eu fiquei pensando o quão maravilhoso seria, um dia, desejar escrever uma carta de amor...
Adriana Freitas