sábado, 25 de agosto de 2012

MOMENTOS ETERNIZÁVEIS


Quem nunca desejou eternizar um momento? Quem nunca quis permanecer naquele momento prazeroso por toda a vida? Que o show nunca terminasse, que o dia nunca acabasse, que o abraço e o beijo nunca se desfizessem... Quando vivemos um grande prazer com uma grande entrega fica realmente muito difícil terminá-lo, considerá-lo findo...
Senti esse desejo recentemente três vezes.
Uma, quando estava assistindo um show de jazz no Savassi Festival em Belo Horizonte, no final de julho. O trio - Shai Maestro Trio - era composto por um pianista, um baterista e um contrabaixista, sendo os primeiros de origem israelense e o terceiro de origem peruana, mas vivendo nos Estados Unidos. Além de toda beleza das músicas, a integração dos músicos no palco era de uma sintonia amorosa maravilhosa. O prazer em assisti-los era imenso. Eu não queria que o show acabasse! Ao final, ainda em êxtase, fui comprar o cd deles e em casa, ao ouvi-lo não tinha mais a mesma magia. A magia residiu no contato vivo entre nós. E é exatamente esta sensação que eu desejei eternizar...
O segundo momento eternizável, aconteceu numa casa de rock que gosto de ir assistir aos shows, também num final de semana de julho. Conheci um homem e senti algo diferente por ele. A princípio não havia nada de muito incomum: a conversa era boa, o abraço afetuoso e o beijo muito gostoso, e ele, sendo do estado de São Paulo, partiria de volta no dia seguinte. Mas acredito que o verdadeiro diferencial foi que nosso – ou pelo menos o meu - contato foi de uma entrega muito grande ao momento. E ao final, foi muito difícil a separação. O pessoal da casa praticamente nos convidou para pagar a conta e de quebra ir embora – “pelo amor de deus!” rs. Sintonias como esta são raras pra mim e quando elas acontecem, com certeza dá vontade de eternizá-las. Que a noite nunca acabe, que os corpos permaneçam entrelaçados e que o prazer se prolongue infinitamente!
E o terceiro “momento” durou um dia inteiro; eu não queria que aquele dia terminasse! Foi uma viagem que fiz no início de agosto para Ouro Preto – MG, acompanhada de um querido amigo, que se tornou meu guia turístico, já que foi minha primeira visita a cidade. Passeamos por alguns dos principais pontos turísticos. O dia foi perfeito, tudo deu certo. A cidade é muito bonita, com uma riqueza cultural que me agregou alguns valores e emoções, a gastronomia uma delícia, enfim, vivi uma experiência eternizável.
Mas infelizmente as coisas se findam e só nos resta o sabor da memória. Bom aqui relembrar o Drummond:
Memória

Amar o perdido
deixa confundido
este coração.

Nada pode o olvido
contra o sem sentido
apelo do Não.

As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão

Mas as coisas findas
muito mais que lindas,
essas ficarão.
Mas as coisas findas só ficarão quando tivermos uma memória saudável. A memória “serve a dois senhores” podendo ser tanto uma dádiva como também uma maldição. Para as memórias traumáticas não elaboradas, pode tornar-se um sofrimento sem igual. Para as memórias eternizáveis é fundamental.
Imaginem se não pudéssemos relembrar os bons momentos? O filme “Como se fosse a primeira vez!”, dirigido por Peter Segal, mostra bem claro este drama. A personagem Lucy Whitmore tem um problema de memória e no dia seguinte não se lembra de nada do dia anterior e o outro personagem Henry Roth, que se apaixonou por ela, tem que conquistá-la todos os dias. Relembrem também das pessoas que sofrem de demências ou Alzheimer? Será que elas sentem a angústia da falta de memória ou será que a angústia é nossa, de quem olha de fora? Ou será que inconscientemente essas pessoas desejaram esquecer suas vidas porque elas eram tão miseráveis que não valiam a pena serem lembradas? Ou ainda, se desejavam desesperadamente esquecer traumas muito profundos e dolorosos?
Por outro lado, imaginem se realmente pudéssemos eternizar o momento...  Reviver uma vez, outra e outra a mesma experiência. Não estaríamos paralisando as nossas vidas? Não restringiríamos nossas vidas a apenas um prazer sendo que poderíamos descobrir milhões de outros? Tal prazer não perderia seu caráter prazeroso pela repetição?
O fato é que muito provavelmente só aproveitemos ao máximo os prazeres que temos - quando temos ou nos damos permissão de aproveitá-los - porque eles são extremamente fugazes. E talvez o prazer só seja prazer por ser efêmero, e no momento seguinte nos escapa a mão. Quem sabe se é só assim que aprendemos a dar valor ao momento presente?
Pelo menos nos resta um consolo: já que não podemos ou não gostaríamos de pagar o preço de eternizar os momentos, podemos revisitar as conhecidas experiências prazerosas de vez em quando, seja através da memória, seja pessoalmente numa nova aventura. Mesmo que seja impossível “banhar-se no mesmo rio duas vezes”*, ainda assim vale a pena voltar ao rio em outras estações.
Adriana Freitas

* Referência a famosa frase de Heráclito de Éfeso.


2 comentários:

  1. Humm... muito prazeroso esse texto... momentos tão simples, tão singelos, quando há entrega nos faz sentir tão bem... e no final das contas é isso que importa, e só isso... mesmo que enfrentemos alguma dificuldade num próximo momento... como disse o poeta "a tristeza é o intervalo entre duas felicidades"...
    Bjão Dri!

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    1. Nossa Gabi, vc disse tudo! A vida é muito cíclica, ou melhor recursiva. Todos os momentos, tristes e felizes, são parte fundamental do nosso processo de crescimento. Mas estar entregue pode ser difícil em ambos os casos, dependendo da história de cada um.
      Obrigada mais uma vez por acompanhar e deixar sua contribuição aqui no blog!
      Um forte abraço!

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